RIO - Ultraconectados, criativos, inovadores. Mimados, pedantes, insubordinados. Inquietos, irresponsáveis, informais. Não faltam adjetivos para definir, criticar ou exaltar uma nova turma que chega às empresas nos programas de estágio, uma geração que se poderia chamar "Y 2.0" e que impõe desafios a empresas e recrutadores. Afinal, o que caracteriza essa turma?
Uma das principais diferenças entre esses profissionais - nascidos a partir do fim dos anos 1980 - e os seus antecessores é que os mais novos cresceram numa época de abundância. Eles não se lembram de hiperinflação, recessão e altas taxas de desemprego. Pelo contrário. Enquanto os mais velhos precisaram suar para galgar degraus na vida, a garotada sempre teve tudo. Esse grupo também é chamado por consultores de recursos humanos de "nativos digitais": cresceram junto com a tecnologia e têm muita intimidade com ela. Todos esses fatores fazem com que, ao entrar para o mercado de trabalho, sua atitude seja diferente da dos que vieram antes. Numa economia aquecida - e, portanto, com várias opções - eles valorizam a identificação com os valores da empresa ao escolher um emprego, dão como certa a ascensão profissional e fazem várias coisas ao mesmo tempo.
PODER DE ESCOLHA É MAIOR: - Há algumas características comuns que identificam as pessoas desse grupo. Elas são multifuncionais, estão ligadas e conectadas 24 horas por dia, sete dias por semana. Para elas, as fronteiras do mundo se alargaram, o acesso a informações é muito maior. São também muito competitivas, desejam desafios o tempo todo, querem crescimento rápido dentro da empresa - descreve a consultora Jacqueline Resch. Um conjunto de características entranhado no publicitário Carlos Eduardo Correa Nunes, de 22 anos, que se deu o luxo de escolher bastante antes de se decidir por um programa de trainee, após o fim da faculdade. Ele conta que, durante a maratona de inscrições em diversas seleções, foi conhecendo mais sobre o perfil de cada empresa. Atraído pelos homens azuis do Blue Man Group, acabou fisgado pela campanha | de reposicionamento de uma marca de telefonia celular e decidiu que queria trabalhar ali.
- Eu vim da área de marketing, e sempre me chamaram a atenção as campanhas da TIM. Além disso, o mercado de telecomunicações é muito competitivo e inovador, sabia que seria desafiado constantemente. A minha geração não quer ficar na zona de conforto, não aguenta estagnação. Era isso que eu queria - diz. Com foco no recrutamento de jovens cujo perfil se encaixa nas características da "geração Y 2.0", a empresa, onde a média de idade dos funcionários é 28 anos, propõe em seu programa de talentos rotatividade entre as várias áreas de atuação, metas desde o início do programa, remuneração por desempenho e até cursos de MBA. Tudo isso em três anos, para formar futuros gerentes e não deixar ninguém entediado. A estudante de Psicologia da PUC-Rio Verônica Mazarin, estagiária de recrutamento, também conta que o perfil da empresa foi fundamental para sua escolha, a partir de indicações de amigos. Para quem faz tudo ao mesmo tempo, rotina estática é o pior dos mundos.
- Algumas pessoas que eu conheci me falaram que o trabalho era dinâmico, e o dia a dia, agitado. E eu sou um robozinho: mando e-mail, falo no telefone e pessoalmente ao mesmo tempo. Mesmo com o foco nessa geração, a gerente sênior de desenvolvimento de RH Fernanda Abreu reconhece que esses Ys superdigitais podem encontrar problemas devido a algumas de suas características. Na sua opinião, jovens de classes mais abastadas - ou que têm a seu dispor mais facilidades ou oportunidades - lidam pior com a frustração. - Algumas vezes, falta um pouco de paciência e o entendimento de que é preciso refletir, terminar um ciclo antes de começar outro. E não fugir diante do primeiro obstáculo que aparecer - defende. Jacqueline Resch destaca o ambiente de trabalho e a liberdade de contato com os superiores como outros fatores decisivos nas escolhas de carreiras dos jovens da geração "Y 2.0". - Eles valorizam muito o trabalho com pessoas com quem têm afinidade, em | ambientes mais informais e divertidos. Gostam de ser valorizados pelas ideias e de ter liberdade para se expor. Querem se desenvolver e respeitam seus líderes se reconhecem neles qualidades - ela explica.
A identificação com os valores da empresa e o bom ambiente foram decisivos para a escolha da engenheira Thábatta Santos, de 25 anos. Formada em Engenharia Mecânica, ela saiu de Minas Gerais para ocupar uma vaga de trainee na Mills Engenharia, no Rio. - Aqui é uma grande empresa, mas o relacionamento é mais pessoal, todo mundo sabe o seu nome. O próprio processo seletivo foi transparente, já deixou claro o que eles queriam - relembra ela. Hayla Binebojm elogia a fácil interlocução que encontrou no emprego. - Há uma facilidade de contato muito grande. Transito do diretor ao analista, e todos deixam você muito � vontade. Ao mesmo tempo em que existe hierarquia, ela não intimida. Sócio da Clave Consultoria, responsável pela escolha de estagiários e trainees para várias empresas, Roberto Costa diz que os processos seletivos têm se modificado a fim de avaliar melhor os "Ys 2.0". O perfil e a trajetória de vida dos jovens passou a ser mais considerado do que conhecimentos prévios. São as próprias empresas que agora preferem terminar de formar seus novos empregados.
- Fizemos uma pesquisa no ano passado, cruzando as expectativas do gestores e dos jovens. A partir disso, decidimos mudar alguns pontos. Por exemplo, aquela dinâmica ou painel em que o cara fala só dois minutos fica para trás. Antes da fase presencial, já vamos procurar saber mais sobre a trajetória daquela pessoa. Mais importante do que se dar bem em uma prova de conhecimentos gerais, queremos entender qual o momento da carreira da pessoa e o seu direcionamento para o futuro - argumenta Costa. Com base nisso, passaram a ser aplicados formulários que buscam conhecer as realizações pessoais e profissionais dos estudantes. Tudo para evitar que se encontre o profissional com as competências certas, mas com as expectativas erradas. |